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Não se comunica se primeiro não se escutou

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“Escuta Israel” é uma exortação feita por Deus ao seu Povo, que aparece algumas vezes no Antigo Testamento, mas sobretudo é citada por Jesus ao responder sobre a Lei de Deus: “O mais importante de todos os mandamentos é este: ‘Ouve, ó Israel, o Senhor, o nosso Deus é o único Senhor” (Mc 12,29).

Parte fundamental das relações, a escuta aparece como a abertura à comunicação, já que sem ela não há diálogo. E é justamente nesse contexto que o Papa Francisco escolheu dedicar o tema da 56ª Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações à escuta. O papa fala do “ouvir com o coração”, apontando um caminho para aprimorarmos nossa capacidade comunicativa, fugindo da tão contemporânea pressa em reagir, até mesmo antes de saber o que dizer ou como dizer. 

Francisco, na sua mensagem aos comunicadores, afirma que “escutar é decisivo na gramática da comunicação”, mas explica que nem sempre nossa disponibilidade de escuta coincide com a nossa vontade de sermos escutados. Um limite que reflete diretamente na capacidade de compreensão do outro. 

Escreve o papa: “Na realidade, em muitos diálogos, efetivamente não comunicamos; estamos simplesmente à espera que o outro acabe de falar para impor o nosso ponto de vista.” Francisco explica que nestes casos acontece o que alguns filósofos chamam de Duólogo, ou seja, monólogo a duas vozes, limitando a verdadeira comunicação, que tem como ponto alto o diálogo. 

E mesmo abordando o tema de maneira geral, afinal de contas a escuta é um desafio e uma proposta para todos, o pontífice convida especialmente as pessoas intimamente ligadas aos meios de comunicação a darem atenção a este sentido (escuta). Mesmo sabendo que a tarefa de tantos desses, como os jornalistas, é informar, o papa destaca que essa comunicação pode se tornar vazia se não nascer de uma escuta atenta. E afirma: “Não se comunica se primeiro não se escutou, nem se faz bom jornalismo sem a capacidade de escutar. Para fornecer uma informação sólida, equilibrada e completa, é necessário ter escutado prolongadamente. Para narrar um acontecimento ou descrever uma realidade numa reportagem, é essencial ter sabido escutar, prontos mesmo a mudar de ideia, a modificar as próprias hipóteses iniciais.”

Francisco também chama a atenção para o uso das mídias sociais. Na mensagem, o santo padre apresenta o desafio de se comunicar nesse espaço. Fala do risco de fazer desses meios locais para “espiar” a vida dos outros, e não para ouvir o que se tem a oferecer, e de prestar mais atenção à audiência (visualizações) do que à escuta. E completa com um desabafo: “É triste quando surgem, mesmo na Igreja, partidos ideológicos, desaparecendo a escuta para dar lugar a estéreis contraposições.”

Um tema que Francisco já tinha abordado na exortação apostólica Gaudete et exsultate: sobre o chamado à santidade no mundo atual. Ele dedicou um parágrafo inteiro ao tema digital: “Pode acontecer também que os cristãos façam parte de redes de violência verbal através da internet e vários fóruns ou espaços de intercâmbio digital. Mesmo nas mídias católicas, é possível ultrapassar os limites, tolerando-se a difamação e a calúnia e parecendo excluir qualquer ética e respeito pela fama alheia. Gera-se, assim, um dualismo perigoso, porque, nessas redes, dizem-se coisas que não seriam toleráveis na vida pública e procura-se compensar as próprias insatisfações descarregando furiosamente os desejos de vingança. É impressionante como, às vezes, pretendendo defender outros mandamentos, se ignora completamente o oitavo: ‘Não levantar falsos testemunhos’ e destrói-se sem piedade a imagem alheia” (GE, n. 115).

Num mundo que, como afirmou a Madre (Santa) Teresa de Calcutá, se tem mais fome de atenção do que de pão, o chamado a ouvir com o coração, feito por Francisco nesta mensagem, pode nos provocar a uma avaliação da qualidade da nossa escuta. Podemos nos perguntar: Escutamos, ou apenas reagimos? “Só prestando atenção a quem ouvimos, àquilo que ouvimos e ao modo como ouvimos é que podemos crescer na arte de comunicar, cujo cerne não é uma teoria nem uma técnica, mas a capacidade do coração que torna possível a proximidade” (Francisco).

Por Lizia Costa – jornalista e missionária da comunidade Canção Nova.

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