O Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ é celebrado em 28 de junho, data em que, no ano de 1969, policiais invadiram o bar Stonewall, nos Estados Unidos, para reprimir a comunidade gay que costumava frequentar o local – algumas pessoas, inclusive, foram presas e sofreram diversos tipos de represálias por parte das autoridades -, o que era bastante comum na época. Nesta noite, no entanto, o público se revoltou e, após isso, aconteceu uma série de protestos que marcaram o início do movimento de libertação gay, que transformou a opressão ao público LGBTQIA+ em chamadas para o orgulho e, principalmente, em ações contra atitudes preconceituosas.
Desde então, a comunidade LGBTQIA+ conseguiu impactar a sociedade e conquistar direitos. No entanto, ainda há um longo caminho a ser percorrido. Quando pensamos no mercado de trabalho, não há dúvidas que ingressar no mercado formal é um grande desafio, principalmente para pessoas trans e travestis.
De acordo com dados divulgados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), 90% das mulheres trans e travestis têm na prostituição a sua única e/ou principal fonte de renda. Isso acontece, principalmente, devido à rejeição familiar – que infelizmente é comum -, ao preconceito e, consequentemente, à privação de educação digna e de qualidade. Segundo o mesmo levantamento, 72% não chegam a concluir o ensino médio.
Quando nos deparamos com um cenário como esse, é possível perceber que a entrada no mercado de trabalho para pessoas trans e travestis é dificultada já na infância, com a falta de acesso ao ensino, uma vez que o ambiente acadêmico é importante para a formação de qualquer indivíduo, sendo um dos responsáveis pelo desenvolvimento de conhecimentos e habilidades.
Diante do desafio de aumentar a presença de pessoas trans e travestis no mercado de trabalho, é importante que exista uma mudança já no ambiente escolar, com orientações básicas sobre identidade de gênero, preparação dos professores para lidar com crianças trans e uso do nome social, por exemplo. As escolas e universidades precisam, urgentemente, se tornarem inclusivas e acessíveis para todas as pessoas, independente de gênero ou orientação sexual.
Além da questão escolar, a população trans e travesti enfrenta uma série de desafios que dificultam a sua inserção e progressão profissional, como o acesso à qualificação profissional, discriminação e desconhecimento. Muitas empresas e empregadores têm pouca familiaridade com as questões relacionadas à identidade de gênero e, por isso, acabam reproduzindo preconceitos e estereótipos, o que resulta em falta de compreensão e apoio adequados, tornando o ambiente de trabalho verdadeiramente hostil, repleto de piadas de mau gosto, erros nos pronomes de tratamento, desrespeito ao nome social e, inclusive, a questão da utilização de banheiros.
Para superar essas e tantas outras dificuldades, é fundamental que as organizações adotem uma postura inclusiva e estejam, verdadeiramente, comprometidas com a diversidade. O primeiro passo para isso é na fase de recrutamento e seleção, já que muitas empresas acabam adotando práticas de abertura de vagas inclusivas apenas como uma estratégia de marketing, mas colocam requisitos extremamente rigorosos, o que termina por criar barreiras adicionais, perpetuando a exclusão e marginalização de trans e travestis.
Também é necessária a implementação de políticas inclusivas, treinamentos para os colaboradores sobre questões de gênero e identidade, criação de um ambiente de trabalho seguro e acolhedor e, por fim, a promoção de uma cultura organizacional que valorize a diversidade e celebre a individualidade de cada profissional.
Algo que eu acredito ser super importante para as empresas que desejam se tornar agentes transformadores deste cenário hostil para a comunidade LGBTQIA+ é oferecer workshops para os colaboradores, nos quais trans e/ou travestis compartilhem suas experiências, desafios e aspirações com toda a equipe. Isso possibilita uma maior conscientização e sensibilização sobre as questões enfrentadas, já que estarão ouvindo as vivências e perspectivas destas pessoas, tendo a oportunidade de ampliar seu entendimento e, assim, desenvolver mais empatia.
Neste processo, a empresa deve oferecer canais de denúncia seguros e ações disciplinares efetivas para casos de violação dessas políticas. É importante lembrar também que cada indivíduo é único e, por isso, as necessidades podem variar de acordo com cada pessoa e/ou situação. Portanto, é imprescindível ter diálogo aberto e ser empático com os colaboradores, ouvindo-os e, se necessário, adaptando as políticas e práticas.
Já existem exemplos positivos, como a Microsoft, que possui um histórico de comprometimento com diversidade, além de políticas inclusivas e suporte aos funcionários em todas as fases da transição de gênero, incluindo a utilização de nomes sociais, banheiros adequados e acesso a benefícios de saúde relacionados à transição.
Sei que não são questões simples e fáceis de mudar e, mais do que isso, essas transformações não ocorrem do dia para a noite. Mas, ainda assim, tenha certeza de que uma empresa que possui um ambiente de trabalho mais inclusivo, diversificado e igualitário é um local mais enriquecedor e que contribui para a promoção e a construção de uma sociedade e um futuro mais digno e justo.
Por Cléo Almeida – Gerente de Comunidades e Comunicação da {reprograma}, iniciativa de impacto social que foca em ensinar programação para mulheres em situação de vulnerabilidade social.