*Por Filipe Denki, Laura Finholdt e Felipe Silveira
O setor do agronegócio desempenha um papel fundamental na economia do país contribuindo significativamente para o PIB (Produto Interno Bruto) e para as exportações brasileiras. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes a 2022, o setor representou cerca de 25% do PIB nacional, englobando tanto a produção agrícola quanto a agroindústria, que foi responsável por mais de 20% dos empregos formais no país e representou, aproximadamente, 46% de todas as exportações.
Mas então, o que explica o aumento da inadimplência dos produtores rurais? A conjuntura está a engendrar um cenário complexo para os laboriosos do agronegócio, haja vista a significativa influência exercida por diversos fatores extrínsecos sobre os preços do setor. O embate bélico entre Rússia e Ucrânia tem repercutido de forma direta nos valores de algumas commodities e, por conseguinte, nos custos das rações destinadas aos animais.
Ademais, o conflito armado também impactou o preço do petróleo no âmbito internacional, desencadeando uma espécie de “efeito cascata” nos custos de outras áreas do segmento agrícola.
A carência de fertilizantes provenientes da Rússia no mercado global acarretou em um acréscimo nos preços dos insumos e precipitou uma corrida dos países em busca de novos fornecedores. O risco iminente da escassez de fertilizantes, ou da manutenção de preços elevados, ainda paira como uma realidade amedrontadora para o planejamento das próximas safras.
Outrossim o cenário doméstico do setor agrícola tem sido desafiador. A alta taxa de juros tem dificultado o acesso a crédito por parte dos produtores rurais, o que tem prejudicado o financiamento de suas operações e a queda do preço de grãos, como a soja e o milho, também tem reduzido as margens e atrapalhado os produtores a planejarem suas safras.
Além disso, o setor agrícola também tem sido afetado por uma série de outros fatores, como a seca, as pragas e as doenças. Esses fatores têm prejudicado a produção agrícola e aumentado os custos de produção, o que tem pressionado os lucros dos produtores rurais.
Diante desses cenários globais e domésticos, o Indicador de Inadimplência do Produtor Rural, medido pela instituição Serasa Experian, a cada 3 meses, desvelou, no mês de março de 2023, a cifra de 27,4% dos mencionados produtores rurais, assinalando-se em “vermelho” seus nomes no território brasileiro.
A imagem fotográfica submetida a análise atestou uma oscilação de 0,4 pontos percentuais em relação ao derradeiro levantamento, realizado em novembro de 2022. Em relação ao Estado do Espírito Santo, posicionado em quinto lugar dentre aqueles que contam com menor contingente de lavradores endividados, a proporção alcança 24,9%.
Roraima, Amapá e Amazonas, encontram-se no top 3 da lista, com 50,3%, 48,0% e 47,5%, respectivamente, de produtores rurais endividados nos mencionados estados do norte do Brasil.
A inadimplência dos produtores rurais pode ter um impacto significativo nos fornecedores de máquinas e insumos agrícolas. Quando os agricultores enfrentam dificuldades financeiras e não conseguem cumprir com suas obrigações de pagamento, isso afeta diretamente a cadeia de suprimentos agrícolas.
Primeiramente, a inadimplência reduz a capacidade dos produtores de adquirir máquinas e equipamentos agrícolas necessários para suas operações. Isso pode levar a uma queda na demanda por máquinas agrícolas, afetando negativamente os fabricantes e revendedores desse setor. Menos vendas resultam em menor receita e, potencialmente, em dificuldades financeiras para os fornecedores de máquinas agrícolas.
Além disso, a inadimplência também afeta os fornecedores de insumos agrícolas, como fertilizantes, sementes e defensivos agrícolas. Os produtores rurais podem ter dificuldades em honrar seus compromissos de pagamento desses insumos, o que pode levar a atrasos ou mesmo à falta de pagamento, afetando negativamente os fornecedores de insumos, que podem enfrentar uma diminuição na demanda e uma redução nas vendas.
Em última análise, a inadimplência dos produtores rurais pode gerar o referido “efeito cascata” na cadeia de suprimentos agrícolas, podendo as empresas do ramo experimentarem uma diminuição nas vendas, dificuldades financeiras e até mesmo o fechamento de negócios, caso não consigam lidar com os impactos financeiros da inadimplência.
Diante desse cenário de inadimplência, é fundamental buscar soluções que evitem o fechamento de negócios e promovam a recuperação financeira das empresas afetadas. Nesse contexto, o instituto da recuperação judicial surge como uma possibilidade viável para os fornecedores de máquinas e insumos agrícolas que enfrentam dificuldades financeiras.
O processamento da recuperação judicial é uma ferramenta legal disponível para empresas, incluindo os fornecedores de máquinas e insumos agrícolas, que enfrentam dificuldades financeiras e buscam reorganizar suas atividades a fim de evitar a falência. No contexto da inadimplência dos produtores rurais, a recuperação judicial pode ser uma alternativa tanto para os produtores quanto para os fornecedores que estão sofrendo com os impactos financeiros mencionados acima.
Essa medida pode ajudar o fornecedor a reavaliar sua estrutura de custos, buscar eficiência operacional e adotar medidas de reestruturação que permitam superar a crise causada pela inadimplência, permitindo, assim, que a empresa continue operando, evitando a quebra, preservando empregos e permanecendo com as atividades comerciais.
*Autores:
Filipe Denki – Sócio do Lara Martins Advogados. Especialista em Direito e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO). Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera. Mestrando em Direito da PUC/SP no Núcleo de Direito Comercial.
Laura Finholdt Lopes – Advogada, graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO. Integrante do núcleo de Recuperação Judicial e Falência do Lara Martins Advogados. Escritora de artigos na área de insolvência empresarial.
Felipe José Silveira – Advogado, graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás). Pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil. Advogado no escritório Lara Martins Advogados no núcleo de insolvência empresarial.