A dificuldade de conciliar vida profissional e familiar é um desafio diário para as mães. Apesar de alguns avanços, a falta de políticas públicas que garantam creches e escolas em tempo integral torna difícil conciliar os dois aspectos da vida. Além disso, a cultura organizacional muitas vezes não é amigável às mães, o que pode levar ao preconceito e discriminação na sociedade e no ambiente de trabalho.
Nesse contexto, ao longo dos anos, surgiram políticas públicas voltadas para a garantia dos direitos das mães que trabalham fora, como a licença-maternidade, a creche e a jornada de trabalho flexível, porém, ainda há muito a ser feito para garantir que a maternidade seja vivenciada de forma adequada socialmente falando.
Porém a maternidade na contemporaneidade é um tema marcado por diversas transformações que envolvem aspectos sociais, culturais e políticos. Uma das mais significativas é o número progressivo das mulheres na educação superior, porta de acesso às profissões liberais e a crescente participação feminina no mercado de trabalho. Segundo dados do IBGE, em 2022, 52,7% das mulheres brasileiras estavam trabalhando.
Quando pensamos em história, percebemos que as mudanças foram revolucionárias não só nas expectativas do mundo sobre o lugar feminino na sociedade, mas nas expectativas das próprias mulheres sobre elas mesmas. Os movimentos sociais levantaram questões em nossa sociedade capitalista e patriarcal acerca das oportunidades de trabalho, das questões de gênero e da sexualidade feminina como um todo.
As mulheres como grupo, tornaram-se uma força política e a imagem da mulher, atuando apenas na intimidade como única responsável pelos cuidados com a família, ganha hoje outros contornos que fazem dela um ser que busca no seu desenvolvimento o poder da realização de seus dons, talentos e potencialidades.
Essa mudança tem impacto direto na rotina das mulheres que são mães e que precisam conciliar o trabalho com os cuidados dos filhos. Antigamente, a maternidade era uma obrigação e um requisito da feminilidade, mas com a evolução do pensamento das pessoas, hoje a maternidade acontece não mais por obrigação, mas por uma decisão baseada no livre desejo e afeto, pois a mulher agora ousa inventar o próprio destino de acordo com suas necessidades internas.
Quando eu decidi escrever sobre esse tema, uma cena me inspirou. Eram quase oito horas da manhã e eu notei uma mãe deixando seu filho pequeno de aproximadamente 3 anos de idade na porta da escolinha, com uma bolsa e uma mochila da criança – que ela entregou para o segurança com semblante de quase tristeza ao deixar ali junto com aqueles pertences, seu bem mais precioso, provavelmente até o fim do dia já que ela vestia uma roupa formal de trabalho.
A leitura que eu fiz naquele momento, foi da maternidade na contemporaneidade: que dentre outras questões inerentes ao tema, fala sobretudo da mulher dividida entre a maternidade e a profissão; entre viver o afeto e se destacar no mercado de trabalho; entre a realização pessoal e a realização profissional.
Em 2012 quando engravidei da minha filha eu trabalhava como advogada em um grande escritório em São Paulo. Na época, a notícia da gravidez me pegou de surpresa pois eu não tinha planejado engravidar naquele momento, e por ter pouco mais de um ano no escritório, fiquei preocupada com a reação dos meus gestores e de como seria minha rotina dali em diante.
Por outro lado, meu resultado tinha sido positivo naquele primeiro ano e eu imaginei que por bater todas as metas teria um reconhecimento e uma relação de parceria com meus empregadores. Marquei uma reunião com o diretor e depois de contar da gravidez, falei que eu pretendia continuar trabalhando normalmente até o nascimento do bebê e a resposta dele antes mesmo de eu concluir o que estava dizendo foi: é por isso que eu prefiro contratar homens. Voltei perplexa para minha mesa e depois fui para casa sem acreditar no que eu tinha ouvido aquele dia.
Meses após, eu tive uma questão na gestação que me obrigou a ficar em repouso absoluto e eu me afastei do trabalho. Depois que minha filha nasceu, me ligaram para organizar meu retorno, mas eu decidi não voltar – primeiro, por minha filha ainda ser muito pequena e segundo, pela postura do diretor que refletia a mentalidade do ambiente profissional que eu estava, e que me fez perceber que não tinha mais nada a ver comigo, especialmente depois que me tornei mãe e percebi a importância do desenvolvimento de alguns valores e virtudes no trato com as pessoas, afinal, a partir dali eu seria um exemplo na formação de um novo ser e permanecer em um contexto condizente com minha forma de pensar e viver, tornou-se fundamental.
Hoje o que me ocorre é: se eu diante dos meus privilégios por ser branca, classe média e com curso superior sofri discriminação no ambiente de trabalho quando engravidei, fico imaginando a situação de mulheres que não tem esses privilégios e nem a opção de escolher sair ou continuar de ambientes tóxicos e retrógrados de trabalho por dependerem de seus empregos.
A maternidade é intimamente ligada às questões de gênero, e por isso, é tão importante a conscientização e uma mudança de postura por parte da sociedade e do poder público, com a criação de políticas públicas para garantir os direitos das mulheres afim de minimizar os impactos que ainda sofremos com a disparidade em todos os níveis entre homens e mulheres. Sempre digo e reitero aqui que sou otimista e que enxergo uma evolução diante dessa questão, mas ainda há muito a evoluirmos nesse sentido.
A maternidade contemporânea anda de mãos dadas com a sobrecarga de tarefas e responsabilidades. Muitas mulheres se veem sobrecarregadas com as demandas do trabalho e da casa, além dos cuidados com os filhos. Isso pode levar a problemas de saúde, como estresse físico e mental e ansiedade.
Por isso, a colaboração de todos os integrantes da família é fundamental para harmonia, saúde e felicidade de todos. Enfim, toda essa temática é muito rica e a minha ideia é promover uma reflexão crítica sobre as normas e valores culturais que influenciam a experiência materna e fazer apontamentos que contribuam com a expansão de consciência das pessoas, o empoderamento, a empatia, o respeito pelas escolhas das mulheres e o desenvolvimento de todos nós sobre temas tradicionais diante da contemporaneidade.
Por Caroline Oehlerick Serbaro – advogada especialista em Direito de Família e Sucessões com ênfase interdisciplinar em Psicanálise e Solução de Conflitos.